O padre da paróquia de Ingazeira, Luiz Marques, conhecido no Pajeú como “Padre Luizinho”, natural de São José do Egito, usou sua conta no “facebook” para criticar o uso das emissoras católicas para combater a reeleição da presidente Dilma Rousseff.
Em agosto deste ano, durante evento de que o editor deste Blog participou, lá mesmo em Ingazeira, o padre fez o seguinte alerta ao prefeito Luciano Torres (PSB):
“O candidato de vocês (Paulo Câmara) pode até ganhar a eleição aqui no Pajeú, mas o voto de Dilma ninguém tira. O povo pobre, que é maioria, votará nela de novo porque aprova os programas sociais do governo federal”.
Premonição de quem convive com o povo e sabe interpretar os seus sentimentos. Paulo Câmara, de fato, ganhou a eleição em Pernambuco com 68% dos votos válidos. Mas o candidato dele no segundo turno, Aécio Neves (PSDB), perdeu para Dilma em Pernambuco por 29% a 71%.
Veja o que o padre postou em seu “facebook”:
I) Terminada as eleições, passado o momento de tensões que é próprio desse tempo, no coração do poder político, Congresso Nacional e Poder Executivo, trava-se agora uma luta efervescente entre situação e oposição que também é normal num sistema democrático.
II) Gostaria apenas de expressar minha opinião e sentimentos que me despertaram durante o pleito sobre a atitude equivocada e pretensiosa de alguns sacerdotes que têm programas televisivos em redes católicas, rádios e também inserções em redes sociais, sobretudo aqueles que vivem ofuscados pelas luzes da fama efêmera e ilusória.
III) Refiro-me a canais de televisão de nossa Igreja que não ficaram atrás das demais emissoras que, orquestradamente, escolheram um lado, talvez pensando que o povo inteiro iria atender todos os seus apelos.
IV) Quando um sacerdote diz: “O católico que votar em D vai pro inferno”, outro que diz “onde estão as vozes proféticas do Brasil?”, outro diz ainda que “a Igreja está em perigo se ‘A’ não vencer e será uma grande perda para o Brasil”, etc.
V) Enfim, muitos desses meus colegas, através de pregações, declarações e postagens, usaram do aceno que ainda têm na mídia católica para que, de forma pretensiosa e com orientação teológica recheada de traços medievais, desassociados da realidade
realidade e do sentimento do povo, metessem medo nos que porventura escolhessem a candidata renegada por eles.
VI) A forma de como estes colegas se colocaram e logo era repetido pelo mesmo segmento nas redes sociais, leva-me a lembrá-los que eles não representam e nem expressam o modelo, o jeito e a identidade da maioria dos presbíteros brasileiros.
VII) Lembrem-se de que somos diversos, em lugares e comunidades com características incomuns a à de vocês.
VIII) Somos do Sertão do Pajeú, do semiárido nordestino, onde este povo ímpar em sua expressão cultural, religiosa e política tem inteligência e também tem seus pastores, em sua maioria nativos que estudaram como vocês, conhecem e estão em comunhão profunda com a Igreja e seus anseios atuais.
IX) Portanto, somos do mesmo tamanho. Talvez a diferença é por que muitos de vocês estão imbuídos do mundo da fantasia, embebidos pela luz das câmaras ou dos palcos, que basta serem apagadas que pode levá-los a uma profunda crise vocacional.
X) O lugar onde vivemos é o Brasil real. Quando um de vocês diz: “As vozes proféticas do Brasil se calaram”, tudo porque não se posicionaram diante dos casos de corrupção. Estão também equivocados, pois não existe nenhuma instituição no Brasil que, ao longo de seus 50 anos, tem combatido com todo vigor a falta de ética e de moral na política do país.
XI) Na verdade, o que não vemos é vocês e tais canais se empreenderem nessa luta que a CNBB, a OAB e vários movimentos eclesiais abraçaram. Logo percebo que a indagação do Padre Paulo Ricardo talvez fosse porque a Igreja do Brasil não tenha oficialmente recomendado votos ao candidato tucano (Aécio Neves).
XII) Não sou petista, não defendo nenhum partido. Em nossa história de Igreja aqui (no Pajeú) sempre nos opusemos à corrupção e à política pequena que instrumentaliza o povo. Mas nós, que convivemos diariamente com a realidade concreta do nosso povo, podemos diferenciar o tempo em que nossas Casas Paroquiais viviam constantemente cheias de pessoas atrás de comida, passagem, remédios, roupas, etc.
XIII) Isto não existe mais. E é falso dizer que só foi por causa do Bolsa Família. Os tantos programas, tais como Minha Casa, Minha Vida, Mais Médicos, Seguro Safra, Pronaf, Ciência sem Fronteira, cotas estudantis, FIES, etc, contribuíram para que este povo fosse incluído, considerado gente. Isto não é favor, é conquista de uma gente que há 500 anos vivia sob domínio dos coronéis, sem ter autonomia nem liberdade.
XIV) Existe corrupção, desvio de conduta, falta de ética (impregnada na formação do povo brasileiro), mas nossa Igreja, pelo menos a que está no Sertão do Pajeú, não está sendo conivente. Entretanto, os vários programas sociais implantados não são obras de ficção científica, eles existem. As pessoas nos últimos 12 anos têm o que nunca tiveram e é bom lembrar que aqueles que optaram por Dilma não foram só os contemplados com tais programas.
XV) Muita gente quer mudança, mas não necessariamente mudança de pessoa, os que queriam já foram do poder e não desenvolveram nenhuma política de inclusão verdadeira. Todas estas conquistas levaram o povo mais humilde dessa região a reconduzir a presidente Dilma ao poder. O que devíamos fazer? Ficar contra o povo de Deus, só para satisfazer o ego de alguns que têm um modelo de Igreja desassociado da realidade da vida do povo?
XVI) Não sou a favor da perpetuação no poder nem de um partido nem de um grupo. A alternância de comando é importante e fortalece a democracia, mas para que isso aconteça não basta só dizer que “vai pro inferno” quem votar em A ou em D.
tem que comer do que comemos,
tem que provar do que provamos,
tem que passar nessas estradas,
tem que andar com quem andamos,
tem que rezar, suar e crer
pra ver o dia amanhecer,
tem que amar o que amamos…
Fraternalmente seu colega, Padre como vocês, da Igreja que está no Sertão do Pajeú,
Pe. Luisinho