Bastou o ex-deputado Maurício Rands (PSB) despontar, no momento, como o nome preferido do governador Eduardo Campos (PSB) para disputar o Governo do Estado, para a carta-renúncia dele, escrita em julho de 2012, ser difundida na internet como algo que aponta a maior das suas contradições, podendo contribuir para rifá-lo do processo.
Rands não renunciou ao mandato de deputado federal, mas à vida pública, conforme ele diz no último parágrafo do seu testamento: “Saio da vida pública e da política partidária para exercer ainda mais plenamente a cidadania”.
Aliados do próprio Rands acham que será muito difícil o governador negociar dentro da Frente Popular um nome que tenha feito uma declaração pública pelo abandono da vida pública e depois recuar. “O eleitor pernambucano vai entender? Custo a acreditar”, diz uma fonte integrante da Frente Popular.
Confira abaixo a carta-renúncia:
“Carta ao Povo de Pernambuco
Venho aqui me comunicar diretamente com meus eleitores, companheiros, amigos e com o povo de Pernambuco, em especial com os militantes do Partido dos Trabalhadores – PT, que compartilharam comigo tantas lutas pela democracia e pela construção de uma sociedade melhor.
Nas prévias internas de definição do candidato do PT e da Frente Popular, durante dois meses, participei de intenso debate sobre o Recife e a vida partidária. Interagi com os militantes, na compreensão conjunta de que a melhoria da condição de vida na cidade é um processo de construção coletiva no qual o partido tem grande responsabilidade em servir de exemplo na demonstração de práticas democráticas.
Testemunhei todo o engajamento desprendido e consciente de milhares de pessoas nesse nobre debate. Destes militantes, levarei para sempre as melhores memórias e a eles sou profundamente grato. Depois da decisão da direção nacional do PT, impondo autoritariamente a retirada à minha candidatura e à do atual prefeito, recolhi-me à reflexão.
Ponderei sobre o processo das prévias e sobre o momento político mais geral. Concluí que esgotei por inteiro minha motivação e a razão para continuar lutando por uma renovação no PT. Percebi terem sido infrutíferas e sem perspectivas minhas tentativas de afirmar a compreensão de que o como fazer é tão importante quanto os resultados.
As diferenças de métodos e práticas, aliás, já vinham sendo por mim amadurecidas e acumuladas há algum tempo. Todavia, este processo recente fez com que as divergências ficassem mais claras e insuperáveis. Na luta pela renovação do partido, no
Recife e em outros lugares, infelizmente, têm prevalecido posições da direção nacional, adotadas autoritária e burocraticamente, distantes da realidade dos militantes na base partidária.
No debate das prévias, minha candidatura buscou construir uma legítima renovação por dentro do PT e da Frente Popular. Mas lutamos, também, para renovar os procedimentos com o objetivo de reforçar as práticas democráticas.
Porém, setores dominantes da direção nacional do PT já tinham outro roteiro que não o debate democrático com a militância do PT no Recife e a sua deliberação. Ou seja, cometeram o grave equívoco de ter a pretensão de impor, a partir de São Paulo, um candidato à Frente Popular e ao povo do Recife.
Por não terem dialogado com a militância do PT no Recife, muito menos com a Frente Popular, ignoraram que existiam alternativas, procedimentais e de quadros, dentro do partido, que unificariam a frente em torno de uma candidatura do PT.
Com a decisão da direção nacional do PT, lamentavelmente, esta unidade resultou rompida. Diante daminha discordância com essa ruptura provocada pela direção nacional do partido, concluí que cheguei ao fim de um ciclo na minha vida de militante partidário. É nesse quadro que comunico aqui três decisões tomadas por mim.
Primeiro, a minha desfiliação do PT. Segundo, a devolução do mandato de Deputado Federal ao partido. E, por último, meu afastamento definitivo do cargo de Secretário do Governo Eduardo Campos.
Existiram diversas razões que me levaram a este caminho. A mais crucial dá-se no nível daminha consciência. Sempre agi, na vida e na política, com o maior rigor entre o que penso e o que faço. Sempre cumpri os deveres da minha consciência. Defendi nos debates partidários a renovação do modo petista de governar e a implantação de um novo modelo de gestão no Recife.
Modelo capaz de aprofundar nossa concepção de democracia participativa e especialmente de trazer para a cidade métodos e ações que o Governo Eduardo Campos vem praticando de maneira exemplar e com reconhecimento inclusive internacional, mas que a administração do Recife não conseguiu implantar.
Minha experiência como Secretário do Governador Eduardo Campos foi fundamental para entender a importância da política do fazer, com formas competentes e inovadoras de gerir os recursos públicos, atrair investimentos privados e promover a inclusão social.
Ainda nos debates das prévias, defendi a renovação das práticas e dos quadros partidários, bem como a melhoria da articulação política do governo municipal com o parlamento, os partidos da base e a sociedade civil organizada. Nesses 32 anos de militância, dediquei grande parte de minha vida a fortalecer o campo democrático-popular, lutando para aumentar a participação e consciência política do nosso povo.
Amadureci as decisões que acabo de tomar com base em fatos altamente relevantes que impactaram minha consciência de cidadão. Entre estes, a opção da quase totalidade da Frente Popular pela indicação de Geraldo Júlio como candidato a Prefeito do Recife. Trabalhei diretamente com Geraldo Júlio e sou testemunha de como ele foi central para o sucesso do Governo Eduardo Campos.
Acredito que Geraldo Júlio é o quadro mais preparado para atualizar e aperfeiçoar a gestão municipal do Recife. Implantando na cidade o que o Governador Eduardo Campos está fazendo em Pernambuco, ele vai melhorar concretamente a vida do povo do Recife.
Estou consciente de que o nosso povo vai entender o significado da escolha de um novo quadro para transformar as práticas político-administrativas na cidade. Geraldo Júlio vai representar a renovação dentro de uma frente política que - espero - seja mantida, mesmo com o lançamento de duas candidaturas no seu campo.
Como esta posição tem graves implicações para minha vida partidária, decidi que devo sair do PT e, com dignidade, devolver meu mandato ao partido. E como gesto concreto de que não se trata de um jogo menor, de barganha por espaços de poder, decidi também sair definitivamente do Governo Eduardo Campos. Esse é o custo, sem dúvida elevado, de ser fiel à minha consciência cidadã.
Saio da vida pública e da política partidária para exercer ainda mais plenamente a cidadania.
Recife, 03 de julho de 2012.
Maurício Rands.”