Do blog de José Luiz Fevereiro, dirigente nacional do PSOL e dos meus tempos de movimento estudantil na UFRJ, a mostrar que existe vida inteligente por lá, capaz de perceber que no Brasil não há apenas uma sociedade de classes, mas de castas. E que as “instituições” são, frequentemente, a porta de entrada para o mundo da adesão ao conservadorismo e à manutenção do status quo. A esquerda que quer ser “limpinha e cheirosa” – e isso nada tem a ver com ser honesto, mas com ser “palatável” ao pensamento dominante – de tanto louvar as virtudes dos “homens bons” acaba por se tornar parte deles. Gabeira está aí que não me deixa mentir.
O TRF-4, o Irã , os perus e as rabanadas
José Luiz Fevereiro, em seu blog
Em 2010 o Congresso Brasileiro aprovou a lei complementar 135, a Lei da Ficha Limpa, com apoio da esquerda. De 2008 a 2010 travei o bom combate para que o PSOL não votasse a favor dessa lei. Numa sociedade de classes, reduzir direitos nunca é uma boa opção para quem defende o andar de baixo. Fiz esse debate até ser finalmente vencido em votação na executiva nacional do PSOL onde apenas contei com mais um voto além do meu, algumas abstenções e grande maioria a favor da aprovação.
Delegar a uma casta como a do judiciário o poder de supervisionar a democracia brasileira, definindo por decisões de 4 juízes, 1 de primeira instancia e 3 de segunda instancia , em quem o povo pode ou não votar nunca me pareceu uma boa ideia. A maioria do Poder Judiciário, pela sua própria origem de classe, tenderá a refletir os valores, a cultura e os interesses inerentes a essa condição. Mais de 400 mil presos provisórios, a maioria “pretos-pardos- e-pobres” em penitenciarias superlotadas são a prova quotidiana disso. Permitir restrição de direitos sem condenação transitada em julgado, exceção aberta com a Lei da Ficha limpa, mostra como a fantasia da “neutralidade das instituições” contaminou a esquerda.
Os recentes arreganhos do judiciário avançando na criminalização dos movimentos sociais eram pedra cantada. Daqui até termos sindicalistas, dirigentes de movimentos sem teto e sem terra, dirigentes de trabalhadores rurais, ativistas ambientais e quilombolas afastados das disputas eleitorais por condenações de fancaria não faltará muito. Oligarquias que controlam o judiciário dos seus estados com mão de ferro podem afastar adversários incômodos da disputa dessa forma. Se alguém tinha duvidas disso quando fizemos o debate de 2008 a 2010, o processo que Lula responde dia 24 em Porto Alegre, feito sob medida para afastá-lo da disputa eleitoral de 2018, é o “se situa” que faltava.
Toda a esquerda apoiou essa lei em 2010. Sob o aplauso fácil de um moralismo despolitizado, uma crença infantil que o judiciário seria melhor que os outros poderes da República, coisa que os fatos desmentem a cada dia, colocamos o escrutínio do povo sob tutela do único poder que não responde diretamente a ele porque não é eleito mas concursado, composto portanto pela “meritocracia” tal qual ela existe nestes trópicos.
No Irã, o Conselho de Guardiães, composto por 6 clérigos xiitas indicados pelo Grão e 6 juízes indicados pelo parlamento, decide quem pode e quem não pode ser candidato. No Brasil 4 juízes terão essa prerrogativa. É menos plural.
Naqueles dias de maio de 2010, os perus votaram pela antecipação do Natal.
As primeiras rabanadas serão distribuídas dia 24 em Porto Alegre.