Por Diana Câmara*
Entende-se como período de pré-campanha a fase que antecede a campanha eleitoral. Esta, que se inicia a partir de 16 de agosto, é o momento em que todos os candidatos já estão registrados e podem pedir votos e realizar os atos típicos de uma disputa eleitoral. Ela se estende até o dia da eleição. Desta forma, hoje, podemos considerar que estamos na fase da pré-campanha.
Nesta fase prévia, na prática, é possível aos pré-candidatos se apresentarem como tal e realizar atividades na busca de conquistar o eleitorado, a divulgar seu nome, dizer que concorrerão a determinado cargo, expor suas pretensões e promover reuniões para discutir planos de governo, se posicionar, realizar críticas política e apresentar as bandeiras que defende. Até recentemente, entendia-se que, basicamente, na pré-campanha era proibido apenas pedir votos. Mas alguns sinais alertam para outra questão que os pré-candidatos devem ficar atentos: o excesso de gastos nesta fase.
Por óbvio que durante a pré-campanha existem gastos e podem existir. A lei eleitoral não traz uma rigidez sobre os gastos na pré-campanha, não regulamenta ou limita estas despesas, eles sequer são contabilizados. Ou seja, não há a necessidade de se prestar contas das despesas desta fase. Contudo, no próprio texto das resoluções do TSE que regulamentam as Eleições 2024 vemos a tendência de se observar os gastos na pré-campanha com maior rigidez quando, por exemplo, o artigo que fala de impulsionamento nas redes sociais na fase da pré-campanha diz que “o impulsionamento pago de conteúdo político-eleitoral” somente é permitido durante a pré-campanha quando cumpridos alguns requisitos, dentre eles: “os gastos sejam moderados, proporcionais e transparentes”. A palavra transparente não foi acrescentada no texto legal à toa, mas sim para que, se questionado, os valores gastos com impulsionamento nas plataformas nesta fase antecedente à disputa eleitoral possam ser observados.
O TSE, então, passou a entender que, durante a pré-campanha, os pré-candidatos podem se expor nas redes sociais, fazer eventos custeados pelos seus respectivos partidos para discutir estratégias de campanha e, ainda, gastar recursos, por exemplo, para impulsionar postagens, desde que, frise-se, de forma moderada. Mas, alerto, na divulgação da pré-campanha os gastos precisam ser compatíveis com as possibilidades de um pré-candidato médio. A ideia é que outros possíveis concorrentes também possam arcar com o valor. Isso visa impedir gastos extraordinários ou muito significativos, embora não haja um parâmetro específico definido na legislação ou até na jurisprudência.
Atente que o que antes não era observado, passou a ser utilizado por rivais nas disputas eleitorais. Um exemplo disso, são duas ações eleitorais contra o senador Sergio Moro (União-PR). O ex-juiz foi pré-candidato a presidente da República nas eleições de 2022, mas desistiu e concorreu ao Senado. O principal argumento dos processos é que a exposição do ex-juiz na pré-campanha à Presidência e a verba utilizada influenciaram na disputa pela vaga de senador no Paraná. Recentemente o TRE/PR julgou as ações improcedentes, mas o processo ainda pode ser reanalisado pelo Tribunal Superior Eleitoral, correndo o risco de serem revertidas as decisões.
A discussão em torno dos gastos oriundos das atividades de pré-campanha não é consenso, alguns especialistas opinam que deveria ser no montante de 10% do teto de gastos da campanha, outros que seja no patamar de 20% ou 30%, mas, reforço, não há uma regra que estabeleça o teto de gastos. Todavia, uma diretriz é clara: não é admissível em ano de eleição gastos exorbitantes com atividades de pré-campanha ou campanha, pois entende-se que quebra a isonomia do pleito entre os candidatos.
Foi comungando desta posição que o Tribunal Superior Eleitoral cassou o mandato da Senadora Selma Arruda, mais conhecida como Juíza Selma (ex-PSL, atual Podemos), eleita por Mato Grosso em 2018, por, em síntese, ter omitido da Justiça quantias expressivas usadas para pagar despesas de campanha no período pré-eleitoral como, por exemplo, contratação de empresa de pesquisa e de marketing para produção de jingles, vídeos e fotos antes do início oficial da campanha. No processo, ficou comprovado, através da juntada de contratos, notas fiscais e depoimentos, o uso não declarado na sua contabilidade da campanha de mais de R$ 1,2 milhão gastos durante a pré-campanha. Desta forma, os ministros do TSE, por seis votos a um, entenderam que houve uso de caixa dois e abuso de poder econômico na eleição da senadora.
Esta decisão é considerada como emblemática e nos dá um panorama do enrijecimento da análise da Justiça Eleitoral sobre a omissão dos gastos de campanha, inclusive pré-campanha, e sobre as prestações de contas. Esta última, deve ser encarada com muita cautela e atenção pelos candidatos para não ter o mesmo destino da senadora: ganhar a eleição e perder o mandato.
Os gastos exorbitantes da senadora, bem como agora do ex-juiz Sérgio Moro, durante a pré-campanha chamaram a atenção dos adversários que não se acanharam em confeccionar um dossiê documentando tudo e, munidos de muitas informações e provas incontroversas, acionaram o Judiciário Eleitoral na tentativa de cassar o mandato. E, registre-se, este movimento também está sendo observado para as candidaturas proporcionais que cometem excessos de gastos.
*Advogada especialista em Direito Eleitoral, ex-Presidente da Comissão de Direito Eleitoral da OAB/PE, membro fundadora e ex-presidente do Instituto de Direito Eleitoral e Público de Pernambuco (IDEPPE), membro fundadora da Academia Brasileira de Direito Eleitoral e Por Diana Câmara*
Madalena França via Magno Martins