O fato político mais importante da semana passada não foi a condenação de Lula por Sergio Moro. Antes de abordar esse fato político que preponderou sobre todos os outros, vale explicar por que a condenação de Lula não mudou muita coisa no cenário político.
É de duvidar que alguém encontre um único brasileiro medianamente informado que não soubesse que o ex-presidente seria condenado. Onde a novidade ou a importância de uma condenação que todos sabiam que viria e que não gera efeito nenhum, já que Lula pode recorrer em liberdade?
A leitura da sentença de Moro contra Lula é tediosa porque fala pouco sobre acusação que justificaria a prisão do ex-presidente e muito sobre seu julgador. O magistrado passa a maior parte do texto se defendendo das acusações de parcialidade.
O fato político mais importante e menos comentado da semana, na opinião desta página, foi nota oficial emitida pelo PSOL protestando contra a condenação de Lula por Moro.
Leia, abaixo, a nota do PSOL sobre a condenação de Lula, emitida no dia em que ocorreu.
NOTA DO PSOL SOBRE A CONDENAÇÃO DE LULA EM 1ª INSTÂNCIA
O PSOL sempre esteve na linha de frente da luta contra a corrupção e em defesa da ética na política. E, por meio de sua ação, sempre rechaçou a impunidade, assegurados o amplo direito de defesa e as garantias do Estado Democrático de Direito. Continuaremos defendendo o aprofundamento das investigações sobre toda a casta política acusada e denunciando as tentativas de “estancar a sangria”.
O PSOL também sempre esteve à frente da luta pelo fim do financiamento privado de campanhas e a ingerência do poder econômico na vida pública, razão principal da disseminação da corrupção no país, como todo povo brasileiro pode acompanhar.
O PSOL é contrário a qualquer relação de promiscuidade com empresas e defende a punição exemplar de casos de corrupção dos poderosos. Ninguém está acima da lei, seja presidente, juiz, parlamentar ou empresário, mas é necessário para condenar – ato conclusivo da investigação – que haja provas robustas.
No caso da condenação do ex-presidente Lula pelo juiz Sérgio Moro, no processo referente ao chamado triplex, consideramos que a ação penal é frágil em termos de materialidade e provas, reforçando a tese do arbítrio e da ação persecutória que se materializou na condução coercitiva de Lula e na divulgação ilegal de áudio contendo diálogo entre Dilma e o ex-presidente, procedimento duramente repreendido pelo então Ministro do STF Teori Zavaski.
Não concordamos com o uso político da Operação Lava-Jato, na esteira da consolidação do golpe institucional, com vistas às eleições de 2018. Chama atenção a divulgação ser feita horas após a aprovação do desmonte de direitos, patrocinado pela reforma trabalhista, e no dia de início da discussão sobre a autorização, pela Câmara dos Deputados, da investigação de Temer por corrupção passiva, em meio a um escandaloso processo de compra de votos na tentativa de salvar seu desgoverno. Busca-se claramente desviar a atenção e favorecer planos continuístas.
O PSOL nasceu como oposição de esquerda aos governos petistas e seu projeto de conciliação de classes, sempre denunciando a opção por alianças conservadoras para garantir a governabilidade. Em qualquer cenário, teremos candidatura própria no próximo ano. Nem por isso, porém, consideramos justo condenar alguém objetivando inviabilizar um concorrente na disputa presidencial. O PSOL se afirma crítico ao ato de Moro, bem como à campanha midiática em torno dele. O golpe institucional de 2016 continua produzindo seus efeitos nefastos sobre o povo brasileiro e colocando exatamente corruptos no Planalto, para fazer as maiores perversidades contra o povo brasileiro e seus direitos.
Executiva Nacional do PSOL
Bancada do PSOL na Câmara dos Deputados
12 de julho de 2017.
Por que essa nota é tão importante? Simplesmente porque o PSOL passou praticamente todo o governo Lula e todo o governo Dilma como um dos maiores inimigos dos ex-presidentes da República petistas e do partido deles.
Apesar da pouca expressão do PSOL, a decisão do partido é relevante pelos seguintes pontos:
1 – Abre espaço para que uma fila de movimentos sociais que vinham se abstendo de condenar a perseguição a Lula se juntem a protestos contra essa perseguição que ocorrerão por todo país nos próximos dias.
2 – Isola a ala radical de Luciana Genro, candidata a presidente pelo PSOL em 2014, que chegou a pedir a prisão de Lula e a elogiar os abusos da Lava Jato.
3 – Esvazia o movimento anti-Lula na esquerda mais radical e abre espaço para negociações com a centra-esquerda no duro enfrentamento da extrema-direita no ano que vem, que as pesquisas mostram que está crescendo fortemente no Brasil.
Conclusão: a decisão do PSOL de reconhecer o inegável rompe a decisão política que o partido adotara de apoiar o arbítrio contra Lula não só por rancor contra o PT, mas por achar que poderia substituí-lo se este fosse destruído.
Os efeitos da possível distensão entre PT e PSOL não são pequenos. A tão sonhada união da esquerda em uma eleição tão decisiva como a de 2018 ainda está distante, mas, agora, está no horizonte.
Ainda é forte na esquerda mais radical a ideia de não aceitar as regras do jogo e de viver na ilusão de uma revolução socialista que poderia ocorrer um dia. O PSOL, apesar de ser considerado “pouco radical” pela extrema-esquerda, tem forte influência sobre movimentos sociais importantes.
Em todas as eleições, o PSOL sempre teve o papel de puxar o PT para baixo. Os candidatos psolistas não subiam e tentavam impedir que os do PT subissem. Um acordo com esse partido pode eliminar uma ajuda fundamental para a direita.
Para que se possa mensurar a ajuda que o PSOL sempre deu às direitas, basta lembrar que foi esse partido que inventou a tese “brilhante” sobre “estelionato eleitoral” de Dilma, desencadeada nos primeiros dois meses de 2015 e que foi responsável por afundar rapidamente a popularidade da ex-presidente, permitindo à direita dar o golpe parlamentar de 2016.
Ao reconhecer a armação montada pela centro-direita contra toda a esquerda, uma armação que se baseia na destruição moral e política de Lula, o PSOL dá o primeiro passo para reconhecer que só uma esquerda unida poderá enfrentar a retirada de direitos do trabalhador e a depressão das condições de vida dos brasileiros mais pobres.
Ninguém nunca votou no PSOL, mas as detrações do partido contra Lula e o PT sempre foram ouvidas pelos que poderiam votar na centro-esquerda e acabaram indo para a centro-direita porque a própria esquerda recriminava o petismo.
Grosso modo, venceu a corrente sensata de Jean Wyllys e Marcelo Freixo e perdeu o radicalismo obtuso de Luciana Genro e companhia.
Não é pouco.
Aliás, a reprovação do PSOL à condenação de Lula é um duro golpe para o arbítrio seletivo da Justiça que vai se assenhorando do país e que é um tigre com petistas e um gatinho contra tucanos contra os quais há muito mais provas.
Uma esquerda unida e sintonizada ainda irá gerar uma bela bancada de esquerda mesmo que a esquerda – com ou sem Lula – perca a eleição presidencial de 2018. Todos os partidos que fizerem parte da coalização progressista elegerão mais deputados e senadores que em 2014 devido ao desgaste profundo que a direita vai experimentar até 2018.
A reforma trabalhista vai provocar um empobrecimento acelerado dos brasileiros. Conforme o sofrimento do povo aumentar, mais a saudade de Lula aumentará junto. E mais a tese do golpe irá se consolidar.
Aliás, vale a pena ler a nota do PSOL porque, enfim, o partido reconhece, oficialmente, que houve um golpe parlamentar no Brasil, o qual chama de “golpe institucional de 2016”.
No dia 20 de julho haverá uma grande manifestação contra a condenação de Lula e já é praticamente certo que será engrossada pela Frente Povo Sem Medo, ligada à esquerda mais radical (termo não-pejorativo), PSOL incluído. Não é pouco.