O Conversa Afiada reproduz trecho de entrevista concedida por Flávio Dino (PCdoB), Governador do Maranhão, a Bernardo Mello Franco, do Globo Overseas.
Em pauta, a declaração de Bolsonaro na última sexta-feira, 19/VII, em conversa com o ministro Onyx Lorenzoni:
“Daqueles governadores ‘de paraíba’, o pior é o do Maranhão. Tem que ter nada com esse cara”, disse Bolsonaro:
O GLOBO: O que o sr. achou da fala do presidente?
FLÁVIO DINO: Foi a prova que tem um insano no comando do país. Há um método instalado no poder central. É um método de discriminação, de perseguição e de preconceito.
O presidente externou uma visão de preconceito, de ódio. E reiterou essa visão em outro vídeo, dizendo que todo nordestino é “pau de arara” e “cabeça chata” (em live com o ministro Tarcísio Freitas, na quinta à noite). Isso nada mais é que a repetição de tratamentos pejorativos para menosprezar uma região que concentra um terço da população brasileira.
E o fato de ser descrito como o pior dos governadores?
DINO: Não me abalei. Não é a opinião do presidente que baliza as minhas ações. Fui eleito duas vezes em primeiro turno, em 2014 e 2018. Isso confirma que temos apoio da maioria da sociedade no nosso Estado. Em uma semana, nosso governo teve mais resultados que o dele em 200 dias.
O sr. vinha evitando o confronto com o Planalto. Ficou surpreso com o tom do presidente?
Fiquei, porque foi uma agressão gratuita. Não havia nenhum episódio que justificasse esse nível de agressividade, de perseguição e de retaliação.
Eu e os demais governadores de partidos de oposição temos procurado praticar a boa política republicana. Com o direito à crítica, garantido na Constituição, e o diálogo institucional, a favor de tarefas de interesse comum.
Essa agressividade não é da tradição brasileira. João Figueiredo, o último presidente da ditadura militar, manteve relações institucionais com governadores de oposição, como Franco Montoro (SP) e Leonel Brizola (RJ).
A que atribui o fato de ter sido apontado como o pior dos governadores?
Isso deriva da visão extremista e sectária que ele tem praticado. Um traço do discurso fascista é a identificação de inimigos para justificar suas próprias carências.
As pesquisas mostram que o governo não consegue cuidar do que é fundamental, como o desemprego e a recessão. Para esconder este fato, o presidente pratica a política da agressão, da busca de inimigos. É para tentar esconder o mau governo que ele faz.
O que muda depois desse bate-boca?
No meu caso, nada. Não vou recuar um milímetro. Mais que um direito, considero que é um dever dizer o que penso. O país precisa de uma correção de rumos. Não há uma agenda sequer em que se identifique uma preocupação com o social.
Se foi o intento dele foi me silenciar, será inútil. Não vou aceitar que um discurso de caráter autoritário determine minha atuação política.
É um dever resistir a qualquer proposta de caráter ditatorial no Brasil. Não tenho medo de ditador nem de projeto de ditador.
Não se trata apenas de algo tosco ou ridículo. É preciso compreender que a visão expressada pelo presidente da República é perigosa para o Brasil.
Agora inviabilizaram a presença do governador da Bahia numa inauguração em seu Estado (do Aeroporto Glauber Rocha, em Vitória da Conquista). Ele está criando um ambiente de conflituosidade em que até coisas básicas, como a inauguração de uma obra, se tornam impraticáveis. Não é algo isolado contra o Flávio Dino. É uma coisa geral, que visa promover uma desorganização da política brasileira.
O sr. teme retaliações práticas ao seu Estado?
Espero que não. Não quero nenhum tipo de privilégio, só o que está garantido na Constituição e nas leis. Se essa retaliação se confirmar, vou usar todos os meios para proteger os interesses de sete milhões de pessoas.
Ele disse para não “dar nada para esse cara”, como se eu pedisse alguma coisa para mim. Nunca pedi e nunca pedirei. O que ele quis dizer foi para não dar nada à população do Estado, e isso viola os artigos 19 e 37 da Constituição.
Até achei engraçado o termo. Agora vou cantarolar aquela música do Roberto Carlos, “Esse cara sou eu”. O presidente me promoveu, criou um jingle para mim.
O sr. é citado como possível candidato ao Planalto. Este episódio o ajuda?
Parece que o presidente resolveu me lançar (risos). Em cinco dias, ele deu cinco declarações seguidas me citando como seu adversário. Eu não trato de eleição agora. Quem só pensa na próxima eleição é o presidente, que deveria pensar em governar.
Postado por Madalena França