Por Milton Alves*
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que lidera com folga as pesquisas eleitorais para o pleito presidencial de outubro, iniciou o ano pautando o debate sobre uma possível agenda econômica de reconstrução do país, devastado pelo golpe de 2016 – com a Ponte para Futuro de Temer -, pela Lava Jato de Sergio Moro e mais ainda pelo desastroso governo Bolsonaro.
Lula defendeu a necessidade de revogação da chamada reforma trabalhista e anunciou a medida como um fator indispensável para uma retomada da economia, gerando empregos e valorizando o trabalho. O líder petista citou como exemplo a negociação tripartite ocorrida na Espanha entre o governo de Pedro Sanchez (PSOE-Podemos), centrais sindicais e confederação empresarial que revogou pontos de uma reforma trabalhista imposta durante o governo direitista de Mariano Rajoy (PP).
Superexploração e precarização
A reforma trabalhista de 2017, uma medida executada pelo governo golpista de Michel Temer (MDB), não gerou novos empregos, promoveu uma precarização sem precedentes nas condições de trabalho e reduziu a massa salarial do conjunto da classe trabalhadora. Além disso, com a eliminação de aproximadamente 100 cláusulas protetivas contidas na Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), o patronato foi à forra aumentando a superexploração dos trabalhadores e bloqueando a ação sindical no chão de fábrica — o que enfraqueceu o dispositivo de pressão dos sindicatos.
O aceno de Lula, que foi acompanhado de uma reunião com dirigentes de centrais sindicais e representante do governo espanhol (on line) durante a semana, provocou uma imediata reação de políticos serviçais da Faria Lima, como João Doria, candidato presidencial do PSDB, Michel Temer e o do ex-presidente da Câmara de Deputados, Rodrigo Maia.
Os políticos da velha direita neoliberal e a mídia monopolizada condenaram a intenção de Lula de revogar o desmonte da CLT e apelaram para a chantagem em nome do “mercado” contra a proposta do petista.
Mimimi neoliberal do mercado
Na mesma direção, a presidenta do PT, deputada Gleisi Hoffmann, indicou as medidas de um programa de governo de Lula: “O PT quer mostrar, desde já, que vai revogar o teto de gastos, a política de preços da Petrobras e a reforma trabalhista Não tem necessidade de carta ao povo brasileiro, as pessoas já conhecem o Lula. Não precisamos mais de um Palocci”, declarou a líder petista no site oficial da legenda.
Gleisi classificou ainda de “mimimi do mercado” os ataques contra Lula e as críticas de setores empresariais sobre o fim do famigerado teto dos gastos, que já foi estourado pelo governo de Bolsonaro. Segundo a dirigente, “o teto de gastos foi uma trava colocada nos investimentos, nos gastos sociais, o país estava em uma crise econômica, o Estado precisava agir. Bolsonaro e Temer não respeitaram, o teto passou pelo orçamento de guerra, em razão da Covid-19, depois por medidas provisórias, decretos de créditos adicionais, projetos de lei. Os gastos do governo são feitos por fora, inclusive o orçamento secreto”.
A presidenta do PT também defendeu o fim da atual política de preços praticada pela Petrobras, responsável pela alta preço dos combustíveis. “A primeira coisa que tem de mudar é a política de preços de paridade internacional. Gasolina, diesel e gás de cozinha não têm de ser dolarizados. Privatizaram refinarias, gasodutos, fizeram política de paridade com o dólar. E pra quê? Para aumentar a lucratividade da empresa e dividir dividendos a acionistas, que são, na maioria, estrangeiros. Isso tem de mudar”, afirmou.
Programa de reconstrução do país
Os pronunciamentos de Lula e de Gleisi, nos primeiros dias de janeiro de 2022, apresentaram os contornos de um programa antineoliberal para iniciar a reconstrução do país. Basicamente, cinco pontos foram elencados:
1. Fim do teto dos gastos;
2. revogação da reforma trabalhista;
3. mudança na política de preços da Petrobrás;
4. Rever as privatizações;
5. política externa soberana e pela integração regional.
No entanto, há questões como a independência do Banco Central, a taxação dos ricos e das grandes fortunas para financiar programas sociais, o desmonte institucional — pontos ainda sem uma definição clara de Lula e do PT.
Os economistas Guido Mantega – mais vinculado ao pensamento desenvolvimentista – e Nelson Barbosa – mais próximo do pensamento do mercado – em artigos e entrevistas foram genéricos sobre as propostas econômicas que serão defendidas pelo candidato do PT na disputa presidencial. O que revela as lacunas na formulação de um programa para a futura campanha, até porque ainda há uma série de problemas políticos pendentes de solução — federação partidária, candidatura de vice-presidente (que seja um nome afinado com o programa e não um cavalo de troia tipo Alckmin e assemelhados) e as alianças eleitorais nos estados.
O fato político relevante é que Lula acertou quando pautou o debate na questão da economia, demarcando no terreno das propostas com todos os demais postulantes – Bolsonaro, Moro, Ciro, Doria e Simone Tebet-, que mais uma vez ficaram correndo atrás do experimentado político petista e revelaram praticamente uma mesma visão no debate econômico. Ou seja, no essencial, todos defendem a mesma camisa de força da agenda de recolonização neoliberal para o Brasil