Por Ricardo Kotscho, colunista do UOL
É de lei. Nesta época de passagem de ano, as pessoas costumam fazer planos, promessas e acalentar sonhos de uma vida melhor, com paz no mundo, um bom emprego, geladeira cheia e saúde para dar e vender.
“Feliz Ano Novo!”, desejam todos uns aos outros, mais por hábito do que por convicção, diante das nuvens negras que se formam nos céus do mundo neste final de 2024, que para boa parte da humanidade já vai tarde.
“Esperem para ver o próximo”, pensam os mais realistas. Desalentado com as notícias que acaba de ler, o velho amigo coloca o jornal de lado, e comenta apenas: “As perspectivas não são nada boas. Ainda bem que já estou de saída…”
Aos 80 anos, ele sabe que tem menos tempo pela frente do que para trás, e não se dá o direito de alimentar ilusões de ver algo mudar para melhor ainda nesta vida. Mas continua na luta, não sabe fazer outra coisa.
“Lutei todas as lutas sempre do lado certo. Perdi todas…”, constatou o escritor Antonio Calado em sua última entrevista, muitas décadas atrás, pouco antes de morrer.
Vamos falar a verdade: nunca a paz mundial esteve tão ameaçada como agora, desde os anos 30 do século passado, quando o nazifascismo na Europa nos levou à Segunda Grande Guerra.
Quase um século depois, essa praga, que parecia sepultada para sempre, está de volta, colocando em risco não só as maiores democracias europeias, a começar pela Alemanha, mas ramificada pelo mundo afora, até onde menos se podia imaginar.
É bom lembrar que Adolfo e Benito chegaram ao poder também pelo voto, antes de arrastar seus países para as mais ferozes ditaduras da História. O sentimento comum era de vingança pela derrota na Primeira Grande Guerra que seria compensada com a anexação de territórios vizinhos.
Pano rápido. À frente do movimento Maga (make america great again), Donald Trump se prepara agora para implantar o seu “projeto vingança” contra os inimigos internos e externos que o impediram de ser reeleito em 2020, e ele não esconde isso.
Já anunciou para o seu primeiro dia de governo, no próximo 20 de janeiro, iniciar a deportação de milhões de imigrantes, demitir em massa funcionários públicos, anistiar todos os invasores do Capitólio, sobretaxar as importações. Já falou também em transformar o Canadá no 51º estado americano, retomar o canal do Panamá e anexar a Groenlândia.
Tudo isso vem sendo publicado pela imprensa com a maior naturalidade, sem maiores contestações, o que leva o homem mais poderoso do mundo a avançar cada vez mais nos seus propósitos disruptivos, agora tendo como sócio majoritário o megalomaníaco Elon Musk, para quem só a extrema direita neonazista pode salvar a Alemanha, como já disse.
De fato, a extrema direita está na moda e crescendo na terra de Goethe e em boa parte do mundo, botando fé que Trump se tornará seu grande líder mundial, a empoderar seus atuais e futuros aliados. Por aqui, no Brasil, as milícias digitais bolsonaristas já estão salivando de ódio e rancor, na esperança de que o futuro presidente americano livre os golpistas da cadeia e os leve de volta ao poder em 2026.
Espero estar completamente enganado, vendo fantasmas. Mas não consigo esquecer das histórias que meus pais me contavam na infância sobre os horrores da guerra e como tudo começou. O mundo demorou para se dar conta dos perigos que corria e, até acordar, milhões de pessoas já haviam morrido.
Sobreviventes, meus pais vieram para cá, se naturalizaram brasileiros e amavam muito o nosso país, o paraíso na terra para eles, não se cansavam de repetir. Meu pai morreu quando eu tinha 12 anos, antes da ditadura militar, e minha mãe, antes do advento do bolsonarismo. E eu ainda estou aqui, por enquanto. Preocupo-me muito com o futuro das minhas filhas e netos.
Apesar de tudo, espero e torço que vocês recebam boas notícias em 2025, e obrigado por terem me acompanhado por mais um ano. Já lá se vão 60 anos nesta estrada do jornalismo, a melhor profissão do mundo, segundo Gabriel Garcia Márquez.
Com diz o caipira: “De ano em ano, vamo enganano o destino…”
Vida que segue.
Madalena França via Magno Martins
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