“Defunta” põe abaixo coronelismo em Calumbi
CALUMBI – Localizada a 360 km do Recife, às margens do rio Pajeú, com apenas 5.749 habitantes, a pequena Calumbi já entrou para o folclore nacional dos casos pitorescos reproduzidos pelas urnas das eleições municipais deste ano. Ali, por uma diferença de 598 votos, Sandra da Farmácia, do PT, pôs abaixo uma oligarquia mesmo enfrentando a terrível contrapropaganda de que havia morrido. “Meus adversários espalharam a versão da minha morte e imploravam nos comícios para não se votar numa defunta”, relembra a petista.
Aos 52 anos, Sandra Magalhães, que ganhou o codinome de “Sandra da Farmácia”, por ser proprietária de um estabelecimento de comercialização de remédios na cidade, enfrentou problemas de saúde ao longo dos 45 dias de campanha e teve que implantar, em caráter emergência, três pontes de safena. A cirurgia foi feita num hospital do Recife, mas como ela demorou a regressar por recomendação médica, o grupo do prefeito Erivaldo José da Silva (PSB), mais conhecido como Joelson, infernizou a cabeça do eleitorado com a notícia de que ela morrera.
Sandra só reapareceu “vivinha da silva” faltando 15 dias para a eleição. Na prática, quase não fez campanha de rua. Enquanto esteve ausente foi substituída pelo marido, o ex-vereador Arnaldo da Emater. “Eu tive que ir de casa em casa para explicar às pessoas que Sandra estava viva, bem de saúde e que logo voltaria para os braços do povo”, disse Arnaldo. Para ele, quanto mais os adversários espalhavam a versão da morte da sua esposa mais crescia o desejo do povo de votar nela.
Em meio às especulações sobre o estado de sua saúde, Sandra teve que gravar um vídeo, ainda na UTI em recuperação, para ser mostrado nos comícios que havia se submetido à cirurgia de forma bem-sucedida e logo voltaria para continuar sua campanha. Na chegada, faltando 15 dias para o pleito, seus aliados organizaram uma carreata para recebê-la na cidade com uma grande festa. “Fiz uma campanha na reta final muito discreta e temerosa, indo, inclusive, para o comício de encerramento”, lembra a petista.
Agora, já plenamente recuperada, Sandra desaba: “Para mim, foi uma sensação muito estranha estando viva sendo tratada como morta no meu município”, relatou. Nas urnas, apesar de todas as crueldades, a adversária Aline Cordeiro, filha do atual vice-prefeito João Mocó, uma das principais lideranças ligadas ao prefeito, levou a pior, amargando uma das maiores derrotas já sofridas pelo grupo.
Na totalização dos votos, Sandra obteve 2.829 votos contra 2.231 (43,32%) da candidata da situação, correspondente a 54.93% dos votos válidos. Arnaldo Moura, do PRB, teve apenas 90 votos. Brancos somaram 81 e 271 eleitores optaram por anular o voto. A abstenção, que geralmente é muito alta, se manteve em 19,8%.
Sandra filiou-se ao PT a pedido do principal líder da oposição em Calumbi, Cícero Simões, que governou o município por dois mandatos. Natural de Serra Talhada, a 18 km de Calumbi, a prefeita eleita foi gerente do Banorte nos anos 90, mas devido ao fechamento do banco montou duas farmácias, uma em Serra e outra em Calumbi, estando hoje apenas com uma unidade, a de Calumbi, que funciona há mais de 15 anos, servindo de instrumento para o contato mais direto com a população e, consequentemente, sua popularidade.
O que a motivou a entrar na disputa, mesmo doente, foi Simões, a voz mais aguerrida da oposição, e a situação de abandono em que a cidade se encontra. “Aqui, os aposentados estão há oito meses sem receber seus vencimentos, os servidores da Prefeitura em geral há dois meses. A saúde está sucateada, com um hospital desestruturado, sem médico, sem ambulância e sem remédio”, diz Sandra, para quem seu maior cabo eleitoral foi o desgaste do prefeito.
Apesar de petista histórica, Sandra admite que não usou o partido, desgastado em nível nacional, como bandeira em sua campanha. “O tom da campanha foi municipalizado, mas aqui Lula e Dilma ainda reinam absolutos e eu não tive problemas por ser do PT”, afirmou. Diferente de outros municípios sertanejos, que não abrem espaços na política para a mulher, com a eleição de Sandra o município mantém a tradição de ter uma saia à frente do poder. É a quarta prefeita a ser eleita, sequenciando Alice Lima, Maria de Lourdes e Jozenice Alves. Por Magno Martins
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