Assinado por intelectuais e educadores do calibre de Cecília Meireles, Anísio Teixeira, Roquette Pinto e Fernando de Azevedo, esse Manifesto foi escrito e divulgado nos grandes jornais da época defendendo uma ideia avançada de educação e que, até os dias de hoje, baliza nosso modelo educacional: uma escola totalmente pública, essencialmente gratuita, mista (para meninos e meninas), laica (sem a obrigatoriedade do proselitismo do ensino religioso) e obrigatória, em que se pudesse garantir uma educação comum para todos, colocando, assim, homens e mulheres frente a iguais possibilidades de aprendizagem. Defendiam um modelo de escola e de educação sem discriminação de gênero e de raça.
Um dos aspectos centrais do texto desse importante Manifesto, que começa anunciando a educação como uma das mais importantes questões nacionais (“Na hierarquia dos problemas nacionais, nenhum sobreleva em importância e gravidade ao da educação”), é a oposição firme e contundente à diferenciação de uma escola para os ricos e outra para os filhos da classe trabalhadora. Um mote central que tem a sua atualidade ainda nos tempos de hoje, quando a expressiva parte do movimento educacional brasileiro luta, desde 2017, contra o projeto de Reforma do Ensino Médio de Temer/Bolsonaro que preconiza uma escola para ricos e outra para pobres. Só agora, no último dia 24 de outubro, conquistamos a esperança de vê-lo em parte revogado e em parte alterado pela proposta recentemente encaminhada pelo MEC ao Congresso Nacional.
A atualidade do Manifesto de 1932 também se mostra no apontamento, inédito à época, para a definição de aportes orçamentários exclusivos, vinculados às receitas do país, para a aplicação na educação. Uma porcentagem dos impostos tinha que ser voltada à Educação, emanado constitucional brasileiro que, até a década dos anos de 1990, fazia do país o único no mundo a ter vinculado a obrigatoriedade de imposto para Educação. Isso terminou por se inscrever na Constituição de 1934, que terminou se desdobrando mesmo, de fato, como um grito à sociedade brasileira em defesa da educação, em um momento histórico de um Brasil que lutava pela afirmação de propostas novas: reformas estaduais, afirmação modernista, a ideia de construção de partidos políticos democráticos, a consolidação de um sistema sindical emergente e a imposição de um sistema republicano que pretendia inaugurar a Nova República no país.
Apesar de o Manifesto não citar nada diretamente sobre a questão de um piso salarial nacional, como o Decreto Imperial já apontava, os pioneiros de 32 não se esqueceram dos professores e professoras. Defendiam, no texto do Manifesto, que seria preciso investir naqueles/as que são um dos pilares de uma boa educação, com “formação e remuneração equivalentes que lhe permitam manter, com a eficiência no trabalho, a dignidade e o prestígio indispensáveis aos educadores”.
Depois de 91 anos da publicação do Manifesto dos Pioneiros, o Brasil ainda não conseguiu cumprir, de forma integral, a expectativa de construir aquele modelo de escola proposto ainda na década de 30 do século passado. Apesar de termos avançado na universalização das matrículas, ainda padecemos com a qualidade do setor. É fundamental, como também apontado pelos pioneiros, que a União seja o ator principal na construção de uma coordenação nacional da educação em nosso país. E isso só se dará quando conseguirmos criar o Sistema Nacional de Educação (SNE), indicado pela nossa Constituição de 1988 e também pelo Plano Nacional de Educação (PNE), mas nunca implementado.
Como também nunca foi implantado na prática o ideário de um salário digno aos/às professores/as brasileiros/as, ideia que também já havia sido indicada no Manifesto dos Pioneiros. Isso só poderá advir com um piso salarial nacional que seja efetivamente cumprido no país, além, é claro, de termos políticas fomentadas de formação profissional e a construção de carreiras públicas por todos os entes de nossa Federação.
No próximo artigo da nossa série sobre o piso do magistério, vamos tratar sobre a recomendação feita pelos organismos internacionais ligados ao Sistema ONU de 1966, quando a Organização Internacional do Trabalho (OIT) e a UNESCO indicam ações para o pessoal docente. Até lá!
(*) Por Heleno Araújo, professor, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) e atual coordenador do Fórum Nacional da Educação (FNE).
Postado por Madalena França
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