Após Arminio Fraga, ex-presidente do Banco Central; Edmar Bacha, ex-presidente do BNDES;
e Pedro Malan, ex-ministro da Fazenda, que apoiaram a eleição do candidato petista Luiz Inácio
Lula da Silva, terem feito uma carta criticando a postura do presidente eleito em relação ao teto
de gastos, outros economistas publicaram, ontem, uma carta no jornal Folha de S. Paulo
apontando que a ideia de que o teto de gastos é fundamental para garantir a disciplina fiscal
é uma falácia.
Assinaram o texto os economistas José L. Oreiro; Luiz C. Magalhães; Kalinka Martins;
o professor de economia do Instituto de Economia da UFRJ e coordenador do Geep/Iesp-
Uerj, Luiz Fernando de Paula; e o professor emérito da Fundação Getulio Vargas, ex-ministro
da Fazenda (1987, governo Sarney), da Administração e da Reforma do Estado e da Ciência
e Tecnologia (1995-1998 e 1999, governo FHC), Luiz Carlos Bresser-Pereira.
Para eles, a longo prazo, o teto esmaga o orçamento dedicado às áreas social e de investimento
público porque, “ao congelar em termos reais por um período de 20 anos os gastos primários,
o crescimento vegetativo dos gastos com Previdência Social de 3% ao ano faz com que os
demais itens do Orçamento sejam comprimidos”.
Veja a íntegra da carta:
“Nossa intenção, além de parabenizar o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva (PT) pela
sua vitória, é fazer um contraponto à carta dos economistas Arminio Fraga, Edmar Bacha e
Pedro Malan, publicada neste jornal.
Os referidos economistas se opõem ao seu compromisso de revogar o teto de gastos, já que
esse desempenha um papel fundamental de garantir a responsabilidade fiscal, mantendo a
inflação sob controle ao assegurar a confiança do “mercado” nas políticas do governo.
A ideia de que o teto de gastos é fundamental para garantir a disciplina fiscal é uma falácia.
De fato, o teto se mostrou incapaz de impedir que o governo de Jair Bolsonaro (PL) realizasse
um volume de gastos de R$ 795 bilhões extrateto em quatro anos e de criar de novos gastos
públicos a menos de seis meses das eleições.
Os economistas argumentam que o Brasil paga taxas de juros altíssimas porque o Estado não
é percebido com bom devedor. Essa afirmação está equivocada. A avaliação de mercado sobre
o risco envolvido em emprestar dinheiro para governos soberanos pode ser medida pelo Embi+
(a diferença entre o juro que um país emergente cobra em relação ao cobrado pelos EUA),
calculado pelo JPMorgan.
No dia 2 de janeiro de 2003, primeiro dia útil do seu primeiro mandato como presidente da
República, V.Exa. herdou do governo anterior um risco-país medido pelo Embi+ de 1.374
pontos, ou seja, um spread de 13,74 pontos percentuais sobre a taxa de juros dos títulos da
dívida pública americana. No dia 31 de dezembro de 2010 o risco país havia se reduzido
para 189 pontos, prova da confiança do “mercado” na responsabilidade fiscal do seu governo.
O teto de gastos foi aprovado no Senado no dia 13 de dezembro de 2016, data na qual o risco
país medido pelo Embi+ se encontrava em 324 pontos, valor 71,42% acima do registrado no
último dia do seu segundo governo. No primeiro dia útil do governo Bolsonaro, o risco-país
se encontrava em 275 pontos, valor apenas 15% inferior ao observado no dia da aprovação
da emenda do teto, mas 45,5% superior ao verificado em 31 de dezembro de 2010. A avaliação
do mercado é clara: o teto de gastos não foi capaz de reduzir o risco-país.
Fraga, Bacha e Malan afirmam ainda que a elevação da inflação ocorrida em 2021 e 2022 foi
resultado do descontrole dos gastos públicos no governo Bolsonaro, que “furou” o teto em
R$ 117,2 bilhões em 2021 e R$ 116,2 bilhões (previsto) para 2022. Esse é outro equívoco.
A elevação da inflação não foi um fenômeno restrito ao Brasil e tampouco deve-se ao desequilíbrio fiscal, mas sim resultado de eventos que geraram um enorme choque de oferta a nível mundial (pandemia de Covid-19 e Guerra da Ucrânia). A inflação acumulada em 12 meses na União Europeia em outubro de 2022 se encontra em 11,3%, quase o dobro do valor observado no Brasil.
Os referidos economistas sustentam que o problema da falta de recursos para área social e investimento público não são decorrência do teto, mas da falta de prioridade do governo. Contudo, o teto é um elemento que impõe um esmagamento a longo prazo sobre o orçamento dedicado a essas áreas, pois ao congelar em termos reais por um período de 20 anos os gastos primários, o crescimento vegetativo dos gastos com
Previdência Social de 3% ao ano faz com que os demais itens do Orçamento sejam
comprimidos.
Durante o governo Bolsonaro, além da redução do investimento público e dos recursos nas
áreas de saúde e educação, os salários dos servidores foram reduzidos de uma média de
4,4% do PIB dos governos FHC, Lula, Dilma e Temer para menos de 3% do PIB em 2022.
Esse ajuste chegou ao seu limite, não sendo mais sustentável mantê-los comprimidos,
tornando o teto inviável.
Concluindo, entendemos ser legítimo e viável abrir espaço no Orçamento para viabilizar
gastos públicos para enfrentamento da crise social e econômica, que deverá ser combinado,
quando empossado, com adoção de uma nova regra fiscal que combine flexibilidade
orçamentária com sustentabilidade da dívida pública”.
Postado por Madalena França
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