RIO - O ano já começou mais apertado para as despesas educacionais dos estados. De acordo com levantamento feito pelo GLOBO, 16 estados terão de elevar seus vencimentos iniciais pagos a professores da rede pública por conta do reajuste do piso nacional do magistério anunciado anteontem pelo Ministério da Educação (MEC).
Com aumento de 13,01%, a base salarial do ano passado, que era de R$ 1.697, pulou para R$ 1.917,78. Apenas nove estados e o Distrito Federal já pagavam vencimentos acima do novo valor mínimo, entre eles o Rio de Janeiro, e, por isso, não estão obrigados a conceder aumentos salariais neste ano.
Confira aqui os pisos pagos nos estados.
Das 24 secretarias estaduais ouvidas pela reportagem, 15 pagam valores inferiores ao novo piso. Amapá, Pernambuco e Distrito Federal não responderam ao questionário. Para essas entidades, o levantamento utilizou dados da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE) coletados em abril do ano passado, os mais atuais disponíveis pela organização. Acre e Rondônia são os únicos estados que não cumprem sequer o piso anterior, de R$ 1.697,38.
Desde que entrou em vigor, a lei estipulou que os reajustes anuais dos vencimentos obedeceriam a uma fórmula que leva em conta os recursos do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb). O cálculo vincula o aumento ao percentual de crescimento do valor anual mínimo por aluno, referente aos anos iniciais do ensino fundamental urbano.
PISOU SUBIU 78% DESDE 2010
Este seria o maior problema para os gestores. De acordo com números do Conselho Nacional de Secretários de Educação (Consed), desde 2010, por conta dos critérios de reajuste, o piso já subiu 78%, contra uma inflação média medida pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC) de 31%. Nesse mesmo período, os repasses do Fundeb subiram 39%. O maior reajuste salarial até o momento foi 22,22%, em 2012.
Em uma reunião de quatro horas na terça-feira no MEC, pouco antes do anúncio do novo piso, o presidente em exercício do Consed, Eduardo Deschamps, argumentou que muitos estados teriam problema para cumprir o novo valor. Dezenove dos 27 secretários estaduais de educação participaram da conversa:
— É lógico que queremos sempre valorizar o magistério. Agora, a preocupação é que esse reajuste do piso tem sido muito superior ao crescimento do Fundeb. Você acaba comprometendo muitos recursos do Fundeb com pagamento de pessoal, recursos que seriam para demandas de infraestrutura, criação de novas vagas, introdução de novas tecnologias nas salas de aula... Não posso garantir que todos vão terminar o ano cumprindo o novo valor.
Na reunião no MEC, Deschamps pediu para que a União execute também o dispositivo previsto na lei e complemente com verbas os estados que não conseguem cumprir o piso, algo que nunca saiu do papel. Ele também defendeu que a lei do piso seja alterada para que as futuras correções salariais levem em conta apenas o somatório do INPC mais metade da variação anual do Fundeb.
— Desse modo, garantiríamos um aumento real para os professores, mas algo mais factível para os estados.
Outro ponto da legislação considerado um “cabo de guerra” é a questão da jornada de trabalho. Um dos artigos de 2008 determina que União, estados e municípios reservem ao menos um terço da carga horária dos professores para atividades pedagógicas fora de sala de aula. A controvérsia chegou ao Supremo Tribunal Federal (STF) em 2011, que ratificou a constitucionalidade do dispositivo, mas retirou seu efeito vinculante para estados e municípios, o que abriu margem para novas contestações.
No estudo feito pelo CNTE em abril passado, levando-se em conta também esse fator, chegou-se à conclusão de que a lei do piso não era respeitada integralmente em 14 estados. Ou seja, eles desrespeitavam ou a questão salarial, ou a reserva da carga horária de trabalho.
O presidente da CNTE, Roberto Leão, garante que estados e municípios têm recursos para cumprir anualmente os pisos. Leão ressalta ainda que o reajuste de 13,01% desta semana não seria o “mínimo desejável”.
— O ideal para nós seria que o governo federal seguisse os padrões do Dieese, onde profissionais com formação para magistério receberiam R$ 2.923,00, ou seja, 34% a mais do que o anunciado pelo MEC. Mas ainda assim o piso já é uma conquista da classe trabalhadora — disse o presidente do CNTE, que também participou das reuniões em Brasília para estabelecer o reajuste.
Quem não foi ouvido previamente pelo Planalto foram os representantes dos municípios. O presidente da Confederação Nacional dos Municípios (CNM), Paulo Ziulkoski, tinha uma reunião marcada para às 15h de ontem com o ministro Cid Gomes. Ziulkoski imaginava que o novo piso só seria divulgado após sua audiência na capital federal. Mas, para sua surpresa, o valor foi definido na noite anterior.
Decepcionado, o presidente da entidade desmarcou sua reunião em uma carta endereçada ao MEC, lamentando que “mais uma vez não foram consultados os legítimos representantes dos municípios, eleitos pela vontade popular”. A CNM estima que o novo piso custe ao menos R$ 7 bilhões a mais para municípios em 2015.
— Não é um desrespeito, mas falta de consideração com os municípios. Eles conversam com os secretários estaduais, mas não houve nada parecido com os prefeitos — disse Ziulkoski ao GLOBO.
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