Por Fernando Brito
Como os nossos “analistas” econômicos não podem falar as coisas de maneira simples, pouca gente está sendo informada do golpe de esperteza que seria o regime de capitalização a ser implantado – pela turma do “Posto Ipiranga” de Jair Bolsonaro para a economia, Paulo Guedes.
Em poucas linhas – porque há páginas e páginas a preencher com os casos em que é, simplesmente, impossível aplicá-la – a história é a seguinte: sob o controle de bancos e outros agentes financeiros, seria criada uma “nova Previdência” para todas as pessoas que, a partir de agora, entrassem no mercado de trabalho. Como são “entrantes”, só há receita, não há despesa, porque os benefícios só começariam a ser pagos, em escala considerável, daqui a 30 ou 40 anos.
É, na essência, o velho golpe da ‘pirâmide’: muitos investem, poucos recebem, se é que vão receber, porque em 30 anos muitos terão “sumido” e deixarão a conta para o governo, possivelmente à conta de um “fundo garantidor” estatal, como é tradição brasileira. Do aventureiro italiano Carlo Ponzi ao Tenente Felipe Albuquerque – de QUEM onde veio o nome “filipeta”, papel sem valor, com que ele vendia a prazo mais barato que à vista – a história do “pague hoje e leve depois” sempre foi boa fonte de renda para os “espertos”.
Diferentemente deles, porém, nem a promessa de grandes rendimentos há: quem tem plano de previdência (quanto mais recentes, piores) sabe que as taxas são altas e a remuneração é baixa, exceto naqueles de “alta performance”, destinados a quem pode fazer contribuições pesadas.
Mas, no geral, durante anos, será dinheiro barato, captado de forma compulsória, em geral indisponível para quem o entrega e sem qualquer garantia de prover uma renda mínima a quem não acumule saldo suficiente para isso – especialmente os que tiverem trabalho intermitente, que se aposentem por idade com baixo grau de contribuição.
Esquemas de capitalização previdenciária podem ser válidos para quem ganha muito bem e pode dispor de recursos para investir numa renda de longo prazo. Mesmo assim, só compensa porque o Estado os subsidia com dilação fiscal: isenta hoje do Imposto de Renda para tributar (em geral a alíquotas menores) quando do resgate dos valores.
Vale lembrar que, hoje, no Brasil, apenas um terço dos benefícios previdenciários se destina a quem aposentou-se por tempo de contribuição.
Como o regime só se aplicará a quem estiver começando a trabalhar – ou a contribuir, no caso de quem nunca saiu da informalidade – todo o déficit previdenciário atual (e o futuro, de quem já está no mercado) ficará por conta do governo, tendo efeito zero no saneamento do rombo previdenciário.
Até porque não vai tocar no déficit provocado pelos altos vencimentos do serviço públicos, cobertos pela isonomia de remuneração que o empregado vindo da iniciativa privada não tem, como também não no dos militares que, per capita, tem um déficit 20 vezes maior que o atribuído ao pessoal do Regime Geral da Previdência.
Até Bolsonaro está resistindo – ou ao menos parecendo resistir – ao esquema proposto por Paulo Guedes, porque sabe que este projeto não resolve em nada os problemas da previdência.
Mas entrega ao sistema financeiro o “filé” das contribuições previdenciárias: o recolhimento de hoje que só vai virar benefício daqui a algumas décadas.
Se virar, claro, porque do contrário chama-se o bom e velho Estado para resolver.
Madalena França Via Tijolaço
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