Fica-se sabendo, pela entrevista do general Eduardo Villas-Boas a Igor Gielow, na Folha, que o comandante do Exército admite ter pressionado – via Twitter, vejam só – o Supremo Tribunal Federal da não conceder um habeas corpus ao ex-presidente Lula:
Eu precisei ter o domínio da narrativa. Por isso, às vezes nós éramos mais enfáticos na expressão, sempre no limite para não invadir o espaço de outras instituições.
Eu reconheço que houve um episódio em que nós estivemos realmente no limite, que foi aquele tuíte da véspera da votação no Supremo da questão do Lula.
Ali, nós conscientemente trabalhamos sabendo que estávamos no limite. Mas sentimos que a coisa poderia fugir ao nosso controle se eu não me expressasse. Porque outras pessoas, militares da reserva e civis identificados conosco, estavam se pronunciando de maneira mais enfática. Me lembro, a gente soltou [o post no Twitter] 20h20, no fim do Jornal Nacional, o William Bonner leu a nossa nota.
Eu reconheço que houve um episódio em que nós estivemos realmente no limite, que foi aquele tuíte da véspera da votação no Supremo da questão do Lula.
Ali, nós conscientemente trabalhamos sabendo que estávamos no limite. Mas sentimos que a coisa poderia fugir ao nosso controle se eu não me expressasse. Porque outras pessoas, militares da reserva e civis identificados conosco, estavam se pronunciando de maneira mais enfática. Me lembro, a gente soltou [o post no Twitter] 20h20, no fim do Jornal Nacional, o William Bonner leu a nossa nota.
Ao fim de carreira, o general admite, melancolicamente, que não tinha o comando de sua Força.
Teve medo de “pronunciamentos enfáticos” de militares da reserva e até de “civis identificados conosco” que, aliás, foi falha imperdoável da reportagem não indagar quem seriam estes “generais de terno e gravata”.
Villas-Boas passa, na entrevista, a nítida impressão de que quer se eximir do desastre que será, para nossas Forças Armadas, serem mais que comandadas, identificadas com um ex-capitão oportunista, a quem não teve coragem ou competência para afastar dos oficiais generais que saíam (saíam?) do Alto Comando do Exército diretamente para o “baixo comando” bolsonarista, sem nenhum objetivo estratégico que não o de abocanhar parte do poder e impor um discurso conservador que, a esta altura, nem tem como se sustentar por meios próprios, tanto que tem de se servir de Sérgio Moro para dar operacionalidade à repressão política.
Chamei aos generais bolsonaristas de “baixo comando” porque, a esta altura, é impossível deixar de perceber que é Bolsonaro quem tem, afinal, prestígio com a tropa, pela sua inserção nela, inclusive no baixo oficialato a quem, durante anos, deixaram cacifar-se, o que seria evitável pelo conceito simples e direto que sobre ele lançou o ex-presidente general Ernesto Geisel: “é um mau militar”, por lhe faltarem, escandalosamente, as noções de hierarquia e disciplina essenciais às estruturas castrenses.
Nem é preciso falar, claro, na gratuita humilhação a que, com a confirmação de sua “ordem tuitada” – claramente expressa na entrevista – submeteu o Supremo Tribunal Federal.
No final das contas, a corte suprema cometeu o mesmo erro suicida ao deixar Sérgio Moro transformar-se em personificação do Judiciário, tal como o Exército deixou Bolsonaro transformar-se em sua encarnação pública.
Daí a razão de Janio de Freitas, na Folha, preocupar-se com “o risco de [o Exército] ser identificado com possíveis insucessos de Bolsonaro e seu governo”, algo que hoje não é preciso mais que um pouco de bom-senso para se prever.
Dificilmente haverá no comando, ao menos do Exército, um núcleo capaz de preservá-lo deste desastre.
Ao contrário, parece que, pela fraqueza de seus comandos, como o de Villas-Boas, atenderá às ordens de “civis identificados” com ele, transformando-o em milícia de um projeto político, seja lá que desastre for.
Madalena França.
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