* Por Hylda Cavalcanti
Em todas as eleições são observados casos de palanques duplos, mas poucas vezes no Brasil esta situação acontece de forma tão intensa como agora nos apoios à candidatura do ex-presidente Lula ao Palácio do Planalto. Além do caso simbólico de Pernambuco, com Marília Arraes (Solidariedade) e Danilo Cabral (PSB) brigando pela exclusividade de Lula, o petista enfrenta esse tipo de problema também na Paraíba, Maranhão, Bahia, São Paulo e Minas Gerais.
Tende a se deparar com novas divisões em outros estados a partir de candidaturas que se confirmarão nas próximas semanas. Este cenário de disputas e desavenças, conforme analisam cientistas políticos, já prevê confusões a partir de 2023.
Com seu estilo envolvente e tom conciliador, Lula tem tentado falar com todos com o discurso de que não vê problemas nisso, mas caciques do PT nacional demonstram, nos bastidores, preocupações com o que chamam de “riscos colaterais” dos arranjos que estão sendo articulados.
Em São Paulo, são candidatos a governador o ex-prefeito Fernando Haddad (PT) e o ex-governador Márcio França (PSB). Este não aceitou abrir mão da candidatura para buscar uma vaga ao Senado. Em Minas Gerais, o ex-prefeito de Belo Horizonte, Alexandre Kalil (PSD), pré-candidato ao Governo estadual, apoia Lula e vai de encontro a grande parte dos integrantes do seu partido, que apoiam Bolsonaro.
Kalil tem feito tudo para definir apoio ao PT e sempre criticou o governo Bolsonaro, mas encontra dificuldades para essa aliança. Uma delas é a vaga ao Senado na mesma chapa. O PT mineiro defende a candidatura do líder na Câmara, Reginaldo Lopes, enquanto o PSD quer reeleger o senador Alexandre Silveira.
Oficialmente, Lopes já divulgou que, apesar do interesse em disputar o Senado, a decisão final será de Lula e se colocou como soldado aguardando a missão que lhe for confiada. “Se o presidente compreender que nossa pré-candidatura vem para contribuir, garantir a vitória e o melhor palanque, estou à disposição”, afirmou. Nos corredores da Câmara, porém, sabe-se que ele anseia e trabalha pela vaga ao Senado.
Diante do impasse, o PT mineiro trabalha com um plano ‘B’ que pode sair do PSB, com a candidatura do ex-ministro da Saúde e ex-deputado Saraiva Felipe ao Governo. Já há quem veja, em Minas, risco da aliança entre o PT e o PSB não ser formalizada. Se isso vier a acontecer, Lula pode vir a apoiar Saraiva Felipe para governador e dar apoio informal à candidatura de Kalil, a exemplo do que vem acontecendo com Marília Arraes, em Pernambuco.
Na Bahia, o candidato do PT é Jerônimo Rodrigues, ex-secretário de Educação do governador Rui Costa. Mas é tido como certo, por muitos políticos, que Lula também contará com o palanque de ACM Neto (União Brasil), em busca da chamada “janela de oportunidades” que se abriu – e com quem o ex-presidente tem conversado.
ACM Neto disputa o Governo estadual com um ex-assessor, o deputado federal e ex-ministro de Ação Social, João Roma (PL), que tem amplo apoio de Bolsonaro e é candidato bolsonarista ao Governo da Bahia. Foi isso que terminou empurrando o neto do lendário senador baiano já falecido ACM para o candidato petista.
Os dois ambientes de maior tensão, entretanto, estão no Maranhão e na Paraíba. No Maranhão, além do candidato do governador Flávio Dino (PSB), Carlos Brandão, apoiar Lula, também é candidato a governador o senador Weverton Rocha (PDT), que tem estreita amizade com o ex-presidente e, embora do partido de Ciro Gomes, tem sinalizado que estará com o petista.
Formalmente, os petistas maranhenses declaram apoio a Brandão, mas no final de abril militantes fizeram ato de apoio a Weverton, demonstrando que está nítida a dissidência. O presidente do PT em São Luís, Honorato Fernandes, admitiu. “A tendência é que a direção do partido apoie Brandão, mas como se trata de uma pessoa sem afinidade com a base do PT, a militância e os movimentos sociais estarão com Weverton”, frisou.
Na Paraíba, são candidatos ao Governo o governador João Azevêdo (PSB) – que disputa a reeleição – e o senador Veneziano Vital do Rêgo (MDB). Além desses dois palanques, também apoia o ex-presidente a pré-candidata ao Governo paraibano pelo Psol, Adjany Simplicio. Ao ser questionado sobre o caso em que três candidatos claramente falam no apoio à sua candidatura, Lula afirmou, na última semana, que a briga na Paraíba é “daquelas brigas boas”.
“Costumo dizer que um técnico da seleção tem um bom problema quando tem muito jogador bom, por isso, fico feliz na Paraíba. Essa ‘briga’, que não é uma briga exatamente, nada mais é do que muita gente boa querendo trabalhar e fazer aliança conosco e eu não recuso voto”, pontuou.
Para o cientista político Lucas Fernandes, da BMJ Consultores Associados, esses duplos e até triplos palanques podem fragilizar o candidato mais adiante, provocando cisão interna nas bases, uma vez que o novo presidente terá de governar “em um contexto de desavenças nos estados entre as bases ideológica e fisiológica”.
“Há várias lideranças que já se mostram insatisfeitas com Lula pelo fato de sempre priorizar o projeto nacional, colocando algumas especificidades regionais de lado, como aconteceu em Pernambuco. Entre o bônus e o ônus, o bônus é bem mais alto, mas é preciso que os presidenciáveis avaliem os riscos de perda de unidade mais adiante”, destacou.
Vice-líder do PT na Câmara, deputado Zé Neto (PT-BA), concorda que é preciso cuidado, mas defende as alianças. “Há mais bônus do que ônus nos palanques duplos, mas estes arranjos precisam ser articulados com cuidado e estamos fazendo isso. Lula tem tido cautela e está administrando tudo caso a caso. Uma hora tem que dar peteleco, porque ele também tem que montar o cenário nacional. E o tempo irá dizendo como ficarão exatamente os palanques. Deixa chegar o mês de julho”, frisou.
* Jornalista
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