segunda-feira, 30 de maio de 2016
Eduardo Graça, correspondente da RFI em Nova York
A maior associação de estudiosos e pesquisadores da América Latina e
Caribe mandou um recado duro ao governo interino brasileiro nesta
segunda-feira (30). Um painel da organização se transformou em ato de
denúncia do que os intelectuais classificaram de “golpe
jurídico-parlamentar” no Brasil.
Além de uma moção aprovada pela direção-executiva da Associação Latino-americana de Estudos (LASA, sigla em inglês), considerando o processo de impeachment da presidente Dilma Rousseff um
ataque à democracia, o 34° congresso da organização, realizado no
coração de Manhattan, também alertou para a “perigosa ruptura
institucional que pode se alastrar pela região”.
O painel, que não estava previsto no programa inicial do evento, contou
com três intelectuais brasileiros: o ex-ministro Luiz Carlos
Bresser-Pereira, professor da Fundação Getúlio Vargas (FGV), o sociólogo
Adalberto Cardoso, diretor do Instituto de Estudos Sociais e Políticos
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (IESP-UERJ) e a historiadora
e cientista política Helcimara de Souza Telles, da Universidade Federal
de Minas Gerais (UFMG). A mediação foi realizada pelo historiador
Alexandre Fortes, da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). O
evento, que também celebra os 50 anos da organização, contou com a
participação de mais de duzentas pessoas na plateia.
"Golpe branco" de Estado
Bresser-Pereira foi peremptório ao afirmar acontecer hoje no Brasil uma
“farsa jurídica e golpe parlamentar”, impulsionado pela derrocada do
modelo de socialdemocracia com crescimento econômico defendido pelo PT.
“Se o golpe não for revertido, o que ainda é possível no caso de o
governo eleito conseguir mais 5 votos além dos 22 que teve na votação no
Senado, veremos nos próximos anos o desmantelamento do estado do
bem-estar social no Brasil, a estagnação econômica, o aumento da dívida
externa e os movimentos sociais ocupando as ruas”, declarou.
Segundo Cardoso, o “golpe branco dado em Dilma Rousseff no Brasil se deu
com o uso do próprio arcabouço institucional criado pela Constituinte
de 1988". “Foi um golpe ‘branco’ de Estado e também de classe social e
precisamos agora da vigilância das forças democráticas”, afirmou.
Helcimara Telles afirmou que, desde a eleição de 2014, a oposição no
Brasil assumiu uma postura “ambivalente democraticamente” se recusando,
na prática, a aceitar os resultados das urnas. “Houve, também, um
aspecto claramente de gênero no golpe, machista, com a apresentação da
presidente como uma figura histérica. A contraposição é o governo
interino formado exclusivamente por homens”, afirmou.
Em um momento que impressionou a plateia, a cientista política mostrou
imagens criadas de Dilma de pernas abertas em tanques de gasolina de
carros de apoiadores do impeachment. Ela também exibiu a oposição das
capas de revistas semanais brasileiras, apresentando a presidente como desequilibrada emocionalmente e a primeira-dama interina, Marcella Temer, como “bela, recatada e do lar”.
FHC desistiu de participar do evento
O painel terminou com parte da plateia gritando “Fora, Temer!” e
lamentando a decisão do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso
(PSDB-SP). Uma das atrações do congresso, ele não participou do evento
depois de ser revelada a tentativa de um abaixo-assinado pedindo sua
exclusão por ter apoiado o processo de impeachment da presidenta eleita.
A moção de denúncia do golpe aprovada pela executiva da LASA vai à
votação geral no fim da reunião de pensadores sobre a América Latina e o
Caribe, que termina nesta terça-feira (31).
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