O artigo 397 do Código de Processo Penal (DECRETO-LEI Nº 3.689, DE 3 DE OUTUBRO DE 1941) é claro como a luz do sol: “O juiz deverá absolver sumariamente o acusado quando verificar (inciso IV) (…) extinta a punibilidade do agente”.
É nesse contexto que precisa ser comentada a notícia de que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou pedido da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para que fosse declarada a absolvição sumária de sua falecida esposa Marisa Letícia Lula da Silva em duas ações penais.
Marisa Letícia morreu em fevereiro deste ano.
Em 2016, o Ministério Público Federal acusou Lula e Marisa Letícia de serem os donos de um apartamento tríplex e de outro imóvel em São Bernardo do Campo (SP), que seriam resultado de pagamento de propina da construtora Odebrecht.
O indiciamento da ex-primeira-dama, por si só, foi um ato de violência para quebrar o moral do ex-presidente e intimidá-lo, já que ela foi acusada de corrupção por atos criminosos atribuídos ao marido, como se tivesse ajudado Lula no suposto tráfico de influência de que é acusado.
Em março, o juiz Sérgio Moro declarou extinta a punibilidade da ex-primeira-dama, porém não decretou sua absolvição sumária, como solicitou a defesa.
O advogado de Lula, Cristiano Zanin Martins, argumentou que, mesmo com a extinção da punibilidade, a absolvição sumária era necessária para afastar qualquer juízo negativo em relação à ex-primeira-dama, que foi “submetida a humilhações decorrentes de levantamento de sigilo de ligações telefônicas íntimas com os filhos” pelo mesmo Moro, que foi quem vazou as ligações e, portanto, teve intenção de macular a imagem da esposa do ex-presidente como parte do jogo psicológico que faz com seus alvos, “independentemente de culpa”, como ele mesmo costuma dizer.
Os advogados da ex-primeira-dama, agora falecida, sem ter como se defender, tentaram fazer valer a lei, ou seja, o artigo 397, inciso IV, do Código de Processo Penal, que fixa o dever de o juiz absolver sumariamente o acusado quando verificar a extinção de sua punibilidade.
“A redação é de hialina clareza e não comporta tergiversação”, diz o recurso assinado por Roberto Teixeira, Cristiano Zanin Martins, Valeska Teixeira Martins e Alfredo de Araujo Andrade.
Em seu voto, o desembargador federal João Pedro Gebran Neto, relator do recurso no TRF-4, alegou que o Código de Processo Penal determina a extinção da punibilidade em caso de morte e, assim, a presunção de inocência estaria “preservada”.
Disse o relator: “Se isso se dá na forma da absolvição sumária ou posteriormente, com a extinção da punibilidade, é irrelevante do ponto de vista material”.
O desembargador Leandro Paulsen teve o mesmo entendimento. “Quando o réu vem a falecer, extingue-se a punibilidade. O estado não julga alguém que já faleceu até porque não há mais a possibilidade de punição”, analisou.
Paulsen frisou que não haveria interesse processual efetivo na modificação da decisão, pois não ocorreria qualquer alteração na prática.
“Os interesses da falecida foram devidamente considerados pelo juiz e nada mais pode ser dito contra ela”, completou.
Já o desembargador Victor Luiz dos Santos Laus avaliou a extinção da punibilidade como uma decisão “democrática”, que trata igualmente acusação e defesa, visto que impede o estado de seguir a acusação e garante o direito da pessoa falecida de ter a persecução interrompida.
Segundo Laus, a decisão judicial salvaguardou a memória de Marisa.
“Se existe algum debate no imaginário popular, estamos em face da liberdade de expressão assegurada a todo e qualquer cidadão brasileiro. Não temos como proibir essa ou aquela pessoa de anunciar um juízo positivo ou negativo em relação à requerente”.
Esses senhores estão loucos. Em síntese, argumentam, todos, que por D. Marisa Letícia estar morta ela não pode ser mais punida e que esse fato inarredável preserva sua presunção de inocência.
Preserva coisa alguma. Tanto não preserva que a lei OBRIGA o juiz a ABSOLVER réus que faleceram antes de ser julgados, para que não paire sobre sua memória a dúvida de que possa ter cometido um crime.
É nesse aspecto que chama atenção a argumentação do terceiro desembargador citado, Victor Laus.
— vamos rever o que ele disse
“Se existe algum debate no imaginário popular, estamos em face da liberdade de expressão (…). Não temos como proibir essa ou aquela pessoa de anunciar um juízo positivo ou negativo em relação à requerente”.
Como assim a Justiça não tem “como proibir essa ou aquela pessoa de anunciar um juízo (…) negativo em relação” a D. Marisa? Tem, sim. Basta absolvê-la, como manda o artigo 397 do CPP, em seu inciso IV, que, se alguém acusar a falecida, poderá ser processado.
É vergonhoso o que fazem as duas primeiras instâncias da Justiça, unidas pelo corporativismo.
Esse caso pode ir parar no STF. Em tese, Lula tem mais duas instâncias a percorrer e certamente irá percorrer em defesa da segunda esposa que o Estado brasileiro matou, uma por omissão e a outra, agora, por ação direta.
Assista, abaixo, em vídeo, a reportagem do Blog da Cidadania
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