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sábado, 20 de agosto de 2016

Na crise, até 'engravatado' come no Bom Prato

19/08/2016 19:51


Pesquisa do Governo mostra que o perfil de frequentadores do restaurante popular mudou
Por: Neto del Hoyo
antonio.neto@diariosp.com.br
Se o momento é de crise, a receita é economizar. E em tempos onde cada centavo é valioso, almoçar por R$ 1 de segunda a sexta-feira é lucro. O resultado dessa conta mudou o perfil dos frequentadores das unidades do Programa Bom Prato, restaurantes populares que oferecem diariamente almoço e café da manhã, respectivamente, por R$ 1 e R$ 0,50.
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“Aposentado já ganha pouco, tem de gastar o menos possível”, disse Marinalva Pereira dos Santos, de 66 anos, enquanto aguardava sua vez na fila do Bom Prato da Lapa, Zona Oeste, um dos 22 restaurantes do programa na capital. 
Segundo pesquisa da Secretaria Estadual de Desenvolvimento Social, nas filas, agora maiores, houve um aumento de 6,8% nas pessoas com renda de até três salários-mínimos (R$ 2.640), de 9% entre os que possuem casa própria, além de alta também no número de jovens e de trabalhadores que frequentam as 51 unidades no estado. 
Foi o que aconteceu com o porteiro Demerval Marques Saturnino, 54, que há três meses passou a almoçar nos dias úteis  no Bom Prato. “Comer aqui sai mais barato do que fazer comida em casa e trazer marmita”, disse.
Salomão de Melo, 53, almoça na Lapa: 'por dia, gastava R$13' / Nico Nemer/DiárioSP
No primeiro semestre do curso de pedagogia, Francinete de Oliveira Silva, 39, viu no restaurante que fica bem perto de sua faculdade a saída para almoçar antes de seguir para o trabalho. “Se não comer aqui, fico com fome.” Ela conta que, antes de se render ao restaurante popular, saia no prejuízo. 
“O lugar mais barato que já comi por aqui foi R$ 8. Em uma semana (de segunda a sexta) seria R$ 40, e com esse valor eu como dois meses no Bom Prato”, calculou Francinete.
Já o auxiliar fiscal Luiz Cláudio de Jesus, 40, que frequenta o local três vezes na semana, tem na ponta do lápis a conta da economia. “São R$ 240 a menos do que gasto no mês. O dinheiro que sobra garante a mistura do fim de semana.” Esperando sua vez com o dinheiro trocado em mãos, sabe de cor o prato do dia. “Hoje tem carne de porco, uma das minhas preferidas”.
Olho na carteira
Para 93% dos entrevistados na pesquisa, o preço é o principal motivo da frequência. Foi o que levou o casal de namorados Bruno Oliveira Gomes, 20, vendedor, e Patrícia Mandu, 26, balconista, a mudar o local de encontro no almoço. “Cada um gastava uns R$ 25 por dia. Agora, gastamos o que era o valor de um dia em um mês”, contou Bruno. 
Com 20 anos, o vendedor faz parte de outro público crescente no Bom Prato. Segundo o estudo, o número de pessoas entre 17 e 24 anos que procuram o restaurante subiu de 5% em 2014 para 10% no ano passado.
Houve aumento também entre pessoas com mais de 60 anos (de 38,5% para 43,7%). “Hoje em dia, o feijão está tão caro que para comer tem de vir no Bom Prato”, brincou a pensionista Maria de Lima Prado, 65.
Movimento na Lapa é intenso / Nico Nemer/DiárioSP
Análise: Maria Flávia Sgavioli, nutricionista
Prato fica pesado com carboidratos
Se você pensar que uma dieta tem duas mil calorias por dia, ou no máximo 1,6 mil para mulheres, uma refeição com 1,2 mil, como o Bom Prato oferece, é alta. Mas é uma refeição perfeita se você pensar que traz arroz, feijão, carne e salada. O problema são os acompanhamentos que não têm qualidade nutritiva, como pão, farinha e suco, que não é natural. Com eles temos muito carboidrato. Pessoas com diabetes, ou que fazem um regime para perder peso, devem ficar atentas a isso. Se você tirar esses acompanhamentos, o pão e a farinha, por exemplo, terá um prato balanceado. Para quem faz outras refeições no dia, o prato completo com os acompanhamentos se torna pesado em função dos carboidratos.
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Governo descarta escolher público
Secretário garante também que não aumentará os preços. Para isso, orçamento de 2017 será repensado
A mudança no público alvo do Bom Prato é motivo de preocupação para o governo. Criado há 15 anos para atender a população de baixa renda, idosos e pessoas em situação de vulnerabilidade social, o programa viu a crise econômica trazer aumento entre 5% e 6% nas refeições servidas.
Para o secretário de Desenvolvimento Social do estado Paulo, Floriano Pesaro, a chegada de clientes com renda e emprego foi uma grande surpresa. “Para suprir esse aumento na demanda, vamos ter de repensar o orçamento do próximo ano.” Segundo ele, já houve alta recente no subsídio governamental de R$ 3,81 para R$ 4,19 por refeição.
Apesar da mudança de público, o governo garante que os preços congelados desde 2000, quando o programa foi lançado, serão mantidos. Além disso, está descartada a hipótese de criar uma espécie de cadastro para atender apenas pessoas de baixa renda. “O Bom Prato surgiu para ser universal, não queremos discriminar um público. Esse novo perfil é cíclico por conta da crise”, disse. 
Para o consultor financeiro Dori Boucalt, a mudança de perfil sentida no Bom Prato deve durar um pouco mais. “Acaba sendo uma válvula de escape na crise. Podemos moderar também os gastos com alimentação. Quando você tem um valor fixo (R$ 1), pode trabalhar melhor seu orçamento mensal e isso faz diferença”, explicou.

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